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quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

CHELSEA HOTEL #2


I remember you well in the Chelsea Hotel
You were talking so brave and so sweet
Giving me head on the unmade bed
While the limousines wait in the street.
Those were the reasons and that was New York
We were running for the money and the flesh
And that was called love for the workers in song
Probably still is for those of them left
 
Ah but you got away, didn't you babe?
You just turned your back on the crowd
You got away, I never once heard you say
«I need you, I don't need you»
«I need you, I don't need you»
And all of that jiving around...
 
I remember you well in the Chelsea Hotel
You were famous, your heart was a legend
You told me again you preferred handsome men
But for me you would make an exception
And clenching your fist for the ones like us
Who are oppressed by the figures of beauty
You fixed yourself, you said, «Well never mind
We are ugly but we have the music»
 
Ah but you got away, didn't you babe?
You just turned your back on the crowd
You got away, I never once heard you say
«I need you, I don't need you»
«I need you, I don't need you»
And all of that jiving around...
 
I don't mean to suggest that I loved you the best
I don't keep track of each fallen robin
I remember you well in the Chelsea Hotel
That's all, I don't even think of you that often
 
***
 
Lembro-me bem de ti no Hotel Chelsea
Falavas tão séria e tão doce
Chupando-me na cama desfeita
Enquanto as limusines esperam na rua
Foram estas as razões e foi em Nova Iorque
Corríamos atrás do dinheiro e da carne
E a isso chamavam amor os operários da canção
Provavelmente ainda lhe chamam os que sobram
 
Ah, mas tu desapareceste, não foi querida?
Viraste apenas as costas à multidão
Desapareceste, nunca te ouvi dizer
«Preciso de ti, não preciso de ti
Preciso de ti, não preciso de ti»
E todos esses disparates...
 
Lembro-me bem de ti no Hotel Chelsea
Eras famosa, o teu coração uma lenda
Disseste-me de novo que preferias homens belos
Mas para mim abrias uma excepção
E cerrando os punhos para alguém como nós
Que estão oprimidos pelas imagens da beleza
Endireitaste-te e disseste: «Bem, não faz mal
Somos feios, mas temos a música»
 
Ah, mas tu desapareceste, não foi querida?
Viraste apenas as costas à multidão
Desapareceste, nunca te ouvi dizer
«Preciso de ti, não preciso de ti
Preciso de ti, não preciso de ti»
E todos esses disparates...
 
Não pretendo sugerir que fui quem mais te amou
Não sigo as pisadas de cada tordo caído
Lembro-me bem de ti no Hotel Chelsea
Mas é tudo, nem sequer penso tanto em ti
(Tradução livre de Jota Marques)
 
Tal como muitas outras personalidades da época, Leonard Cohen tinha um amor especial pelo Hotel Chelsea, em Nova Iorque: «É um desses hoteis que têm tudo quanto eu quero de um hotel. Porque se às 4 da manhã levas para o quarto um anão, um urso e quatro raparigas, ninguém se preocupa com isso.» Em 1968, Cohen e Janis Joplin encontravam-se hospedados no Chelsea. E, de acordo com a revista Rolling Stone, encontraram-se os dois no elevador uma noite. Janis andava à procura de Kris Kristofferson, porque pretendia gravar uma música dele (a célebre "Me and Bobby McGee" que ficaria célebre mais tarde) e Cohen limitou-se a dizer que ele era o Kris Kristofferson. «Eram tempos generosos», recordou Cohen mais tarde: «mesmo sabendo de que eu era mais baixo do que o Kristofferson, não se importou...» E deram por si a partilhar uma cama por fazer no quarto de Cohen.

Mesmo que Cohen só tivesse admitido aquela aventura de uma noite bastante mais tarde, Janis não teve qualquer prurido em falar do caso numa entrevista, até porque não tinha sido caso único. Ela era uma mulher totalmente desinibida, que teve inúmeros parceiros sexuais nessa época, como Jim Morrison, por exemplo. Quanto a Cohen, escreveu "Chelsea Hotel #2" depois da morte de Janis Joplin, em Los Angeles, a 4 de Outubro de 1970, com 27 anos. Mais tarde o compositor arrepender-se-ia de tornar pública essa relação. Cohen começou a escrever a canção em 1971, num bar dum restaurante polinésio, em Miami e acabou-a em Asmara, na Etiópia, em 1974, quando o reinado de Haile Selassie chegou ao fim. A canção foi incluída no album "New Skin for the Old Ceremony", editado em 11 de Agosto de 1974 com o nome de "Chelsea Hotel #2" por já existir uma versão mais longa que no entanto Cohen não gostava e por isso nunca chegou a ser gravada.


(Post by Jota Marques)

domingo, 11 de dezembro de 2022

CHICO BUARQUE ~ LETRA E MÚSICA

 
Editora: Schwarcz Lda, Brasil, São Paulo (1989)

VALSINHA
(do album "Construção", 1971)

Um dia ele chegou tão diferente
Do seu jeito de sempre chegar
Olhou-a de um jeito muito mais quente
Do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida
Tanto quanto era seu jeito de sempre falar
E nem deixou-a só num canto
Pra seu grande espanto convidou-a pra rodar
 
Então, ela se fez bonita
Como há muito tempo não queria ousar
Com seu vestido decotado
Cheirando a guardado de tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços
Como há muito tempo não se usava dar
E cheios de ternura e graça
Foram para a praça e começaram a se abraçar
 
E ali dançaram tanta dança
Que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade
Que toda cidade se iluminou
E foram tantos beijos loucos
Tantos gritos roucos como não se ouvia mais
Que o mundo compreendeu
E o dia amanheceu em paz
 
(Chico Buarque/Vinicius de Moraes)

(Post by Jota Marques)

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

ERIC CLAPTON: "AUTOBIOGRAFIA"

 

Título original: Clapton - the Autobiography
E.C. Music Limited, 2007
Editora: Casa das Letras, Maio de 2008
Tradução: Pedro Serras Pereira
Dimensões: 150 X 230 X 23 mm
Foto da capa: Norman Watson, 1999
Nº de páginas: 370
ISBN: 978-972-461-803-6

 

Mais do que uma estrela de rock, Eric Clapton é um ícone, uma personificação viva da história da música rock. Bem conhecido pela sua reserva numa profissão marcada pela autopromoção, o exibicionismo e o exagero, decidiu agora contar-nos, pela primeira vez, a sua notável história pessoal e profissional. Nascido filho ilegítimo em 30 de Março de 1945, Eric foi criado pelos avós, nunca conheceu o pai e, até aos nove anos de idade, viveu convencido de que a sua mãe era sua irmã. Nos primeiros anos da adolescência a guitarra foi o seu consolo, e o seu incrível talento iria fazer dele um herói de culto nos clubes ingleses e inspirar os seus fãs mais devotos a escrever, um pouco por todo o lado, "Clapton is God". The Yardbirds, Cream, Blind Faith ou Derek & The Dominos foram os vários grupos a que pertenceu (tocou ainda com Delaney & Bonnie), antes de iniciar a sua imparável carreira a solo em 1970 com um primeiro album homónimo. O amor não correspondido de Pattie Boyd, na altura mulher de George Harrison, fê-lo descer aos locais mais sombrios do desespero, a uma reclusão auto-imposta e à dependência de drogas durante três anos (1971-1974). 

Consegue superar essa fase e finalmente alcança o amor de Pattie, que entretanto se tinha divorciado de Harrison. "Layla" e "Wonderful Tonight" são as duas canções icónicas dedicadas por Clapton à mulher que constituiu a sua grande paixão e com a qual acabou por se casar em 1979. O casamento duraria dez anos, período em que Clapton substituíu a heroína pelo álcool como o seu vício de eleição. Já nos anos 90, Clapton tornar-se-ia pai. Mas justamente na altura em que a sua vida se começava a recompor, foi atingido por um golpe terrível: Connor, o filho de apenas 4 anos que teve com Lory Del Santo, uma actriz da televisão italiana, cai de um 49º andar de Nova Iorque. Noutros tempos, Eric teria reagido à tragédia refugiando-se no mundo das drogas. Mas felizmente tal não voltou a acontecer e Clapton seguiu para diante com a sua música, respondendo à perda de Connor com a beleza pungente de "Tears in Heaven".


Em 2002 casar-se-ia de novo, com Melia McEnery, com quem teve quatro filhas. A família vive nos arredores de Londres. Esta autobiografia de Clapton é uma história poderosa, escrita por um sobrevivente, um homem que atingiu os píncaros do sucesso apesar de todos os seus demónios. É um dos livros de memórias mais cativantes do nosso tempo. «A cena musical tal como a vejo hoje é pouco diferente daquilo que era quando eu estava a crescer. As percentagens são basicamente as mesmas - 95 por cento de lixo, 5 por cento de música pura. (...) A música encontrará sempre uma maneira de chegar até nós, com ou sem negócio, política, religião, ou qualquer outra treta atrás.»

(Post by Jota Marques)

domingo, 27 de novembro de 2022

A TU LADO


A TU LADO
(Mikel Erentxun/Duncan Dhu, 1994)

Pienso en ti
interminablemente en ti
quiero ser
una respuesta para ti
pienso en ti...
 
Creo en ti
inagotablemente en ti
como tu
que confiaste en mi saber
creo en ti
solo en ti
 
Y despertar a tu lado
cada amanecer
y hace rodar mis labios
sobre tu piel
creo en ti
 
Estoy en ti
desesperadamente en ti
y hasta hoy
he aguantado sin hablar
estoy en ti
solo en ti
 
 
A TEU LADO
(Mikel Erentxun/Duncan Dhu, 1994)

Penso em ti
interminàvelmente em ti
quero ser
uma resposta para ti
penso em ti...
 
Creio em ti
inesgotàvelmente em ti
como tu
que confiaste no meu saber
creio em ti
sómente em ti
 
E despertar a teu lado
cada amanhecer
e fazer rodar os meus lábios
sobre a tua pele
creio em ti
 
Estou em ti
desesperadamente em ti
e até hoje
aguentei sem falar
estou em ti
sómente em ti

(Post by Jota Marques)

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

PATTI SMITH ~ "SHE HAS THE POWER"

 
Título original: Patti Smith, She has the power (Ana Müshell, 2020)
Editora: Iguana, Penguin Random House (Outubro 2022)
Tradução: Maria do Carmo Romão
Capa: Adaptação de Teresa Coelho
Nº de páginas: 184
ISBN: 978-989-784-700-4
Comprado por 19,95€ em 20/11/2022 (FNAC-Allegro)

Um dos livros mais sedutores que têm aparecido por aí. Profusamente ilustrado, quase como se de uma banda desenhada se tratasse, é acompanhado por uma escrita simples mas incisiva, que nos dá uma visão bastante abrangente da vida de Patti Smith. A escritora/ilustradora espanhola Anna Müshell faz uma homenagem sentida à cantora, através da sua obra e das personagens que a inspiraram e acompanharam no percurso vital e artístico. Neste livro, Ana Müshell desvenda com precisão e paixão a trajectória da "madrinha do punk": desde a sua infância na zona rural de Nova Jérsia até à sua estadia no boémio Chelsea Hotel em Nova Iorque. Passando pelos primeiros recitais e concertos, esta é uma viagem pelas personagens, momentos, álbuns, livros e inquietações que fazem parte da história desta lenda viva, uma criadora em permanente diálogo com entes queridos que já não estão, numa luta incansável para tornar o nosso mundo melhor.

«Se alguma vez quiseres procurar Patti Smith na tua cidade, fá-lo num café de charme. Pode ser a qualquer hora. Se vires ao fundo uma mulher só, de botas e casaco preto, com uma longa cabeleira grisalha e um gorro de lã, é provável que a tenhas encontrado. Estará certamente concentrada no seu caderno cheio de rabiscos e coisas escritas, com um exemplar de "Les Illuminations", do seu amado Arthur Rimbaud, em cima da mesa, escrevendo e recordando algum ente querido, perdida nos seus pensamentos e recordações, organizando-se e pensando que livro a acompanhará na próxima viagem. Encontrá-la-ás a tomar notas, num guardanapo de papel, sobre aquilo de que falará numa conferência, talvez sobre uma ideia ou um sonho. Quem sabe, estará a trabalhar no seu próximo romance... Acontece que, se tiver acabado de pedir o segundo café, e depois se tiver levantado para pagar e esquecido o casaco preto, é, sem dúvida, Patti Smith.»

(Post by Jota Marques)

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

MORRISON TOTAL

 
Editora:Publicações a Ferro e Aço (Outubro 2021)
Tradução: Vasco Amaral (Edição bilingue)
Prefácio de Tom Robbins
Dimensões: 192 X 262 X 50 mm
Capa dura
ISBN: 978-989-894-906-6
Nº de páginas: 584
Comprado por 40€ no dia 18 de Novembro de 2022 na FNAC-OEIRAS

A "Obra Completa de Jim Morrison" constitui, sem qualquer dúvida, a colectânea mais importante dos últimos anos. O leitor encontra nesta obra a antologia definitiva dos escritos de Jim Morrison, que contém fotografias e excerptos manuscritos dos seus 28 diários. Feito em colaboração com os herdeiros de Jim Morrison e inspirado numa lista chamada "Plano para Livro", descoberta postumamente entre os seus apontamentos, esta edição de referência e notável artigo de coleccionador inclui, entre várias outras coisas, a obra não publicada com uma vasta selecção de apontamentos dos seus diários, transcrições e fotografias raras e notas de produção da última gravação de poesia de Morrison a 8 de Dezembro de 1970, o diário de Paris reproduzido na totalidade (provavelmente o seu derradeiro diário), excerptos dos apontamentos do julgamento de Miami de 1970, o guião e paleta de cores do filme HWY, nunca lançado, letras completas publicadas e não publicadas, e muito mais. É, sem dúvida, um título indispensável para a colecção de qualquer fã ou apreciador da poesia e da música de Jim Morrison e dos The Doors.

James Douglas Morrison (1943-1971) foi um poeta, realizador, argumentista e vocalista e compositor dos The Doors. Antes da sua morte, Morrison autopublicou três volumes de edição limitada da sua poesia: "The Lords/Notes on Vision" (1969), "The New Creatures" (1969), e "An American Prayer" (1970). A editora Simon & Schuster publicou o conjunto "The Lords and The New Creatures" em 1970. As edições póstumas dos escritos de Morrison incluem "Wilderness: The Lost Writings of Jim Morrison, Volume I" (1988) e "The American Night: The Lost Writings of Jim Morrison, Volume II" (1990).

(Post by Jota Marques)

quarta-feira, 16 de novembro de 2022

BRIDGE OVER TROUBLED WATER

BRIDGE OVER TROUBLED WATER
(Composed by Paul Simon; recorded by Art Garfunkel in November 9, 1969)

 

When you're weary

Feeling small

When tears are in your eyes

I will dry them all

 

I'm on your side

When times get rough

And friends just can't be found

Like a bridge over troubled water

I will lay me down

 

When you're down and out

When you're on the street

When evening falls so hard

I will comfort you

 

I'll take your part

When darkness comes

And pain is all around

Like a bridge over troubled water

I will lay me down

 

Sail on, silver girl

Sail on by

Your time has come to shine

All your dreams are on their way

See how they shine

 

If you need a friend

I'm sailing right behind

Like a bridge over troubled water

I will ease your mind




PONTE SOBRE ÁGUAS AGITADAS

 

Quando estás cansada

A sentir-te em baixo

Quando tens lágrimas nos olhos

Eu secá-las-ei a todas

 

Estou a teu lado

Quando os tempos ficam difíceis

E os amigos não aparecem

Como uma ponte sobre águas agitadas

Eu estender-me-ei contigo

 

Quando estás em baixo e fora de ti

Quando estás na rua

Quando a noite cai tão intensa

Eu servir-te-ei de conforto

 

Ficarei a teu lado

Quando a escuridão chegar

E a dor estiver por todo o lado

Como uma ponte sobre águas agitadas

Eu estender-me-ei contigo

 

Navega, rapariga prateada

Navega sempre em frente

O teu tempo começou a brilhar

Todos os teus sonhos estão a caminho

Vê como eles brilham

 

Se precisares de um amigo

Eu navego mesmo atrás de ti

Como uma ponte sobre águas agitadas

Eu acalmarei teu pensamento

 

 (Tradução livre de Jota Marques)


A canção nasceu no Verão de 69, quando Paul Simon começou a escrevê-la numa casa de férias alugada pelo duo em Los Angeles. Curiosamente, tratava-se da mesma casa, localizada numa rua chamada "Blue Jay Way", onde George Harrison tinha composto o tema homónimo apenas dois anos antes. Na altura Art Garfunkel encontrava-se no México, na rodagem do filme “Catch 22 / Artigo 22”. Nesse mesmo Verão a realidade tomava o lugar do sonho e a 20 de Julho o Homem pisava pela primeira vez solo lunar.

Cerca de um mês depois, numas termas portuguesas, dois desconhecidos olhavam-se também pela primeira vez e descobriam o Primeiro Amor (o tal que, segundo os entendidos, é suposto durar toda uma vida). Ele tinha 16 anos, ela 14. O encontro foi breve. E pouco tempo depois a distância intrometeu-se, só lhes permitindo palavras escritas como consolo.

Entretanto Garfunkel, regressado do México, teve a grata surpresa de Simon insistir que a voz em "Bridge" fosse exclusivamente a sua. Assim foi e Art gravou o tema sózinho - as duas primeiras estrófes em Nova Iorque, a terceira em Los Angeles - isto porque de início a canção era para ter apenas duas partes, com uma letra completamente diferente. A extensão ficou a dever-se à insistência de Garfunkel e também do produtor Roy Halee. Consta que mais tarde Paul se arrependeu desse gesto altruísta devido ao grande êxito alcançado pela canção - nada menos do que 5 Grammys: melhor gravação, melhor canção, melhor arranjo, melhor engenharia de som e melhor canção contemporânea. Haveria ainda mais um Grammy para o album, justamente considerado o melhor de 1970.

Quando o single e o album homónimo saíram nos princípios de 1970, aquele romance de férias ganhou novo alento e a canção tornou-se rapidamente num dos seus laços mais fortes: «Porque não páro de ouvir “Bridge Over Troubled Water” e porque me vêm as lágrimas aos olhos quando o faço? Porque desejo tanto ver-te, falar-te, estar a teu lado, não em pensamentos, mas na realidade?» E depois de uma longa espera, o re-encontro tão ansiado aconteceu enfim: «Pusémos o "Bridge" a tocar e começámos a dançar, ternamente, muito juntos, experimentando um mundo de sensações que nos estavam proibidas há tanto tempo! E depois foi o meu primeiro beijo, o nosso primeiro beijo, e não sei descrever a beleza e a maravilha que sentimos. Nessa tarde só essa música tocou no gira-discos e por incrível que pareça nunca nos cansámos de a ouvir. Passámos o resto do dia assim, meio adormecidos, meio acordados...»

Mas uma vez mais a separação voltou a acontecer, só que então com carácter definitivo: «Partíamos com as mãos docemente amarradas e os corações estoirando uma alegria breve, quando a noite descia apaixonada como o longo beijo da nossa despedida»



(O tempo passou. Apenas o tempo. E mais outro tempo também)


Existem amores, vagos e fugidios, que duram apenas três dias. Mas há outros, raros e preciosos, que o tempo e a saudade alimentam e que duram toda a vida. O nosso é destes e regressou, passados quase 20 anos:


«Tu vieste.

E acordas todas as horas, preenches todos os minutos,

acendes todas as fogueiras, escreves todas as palavras.»


Foi um regresso breve, transitório. Mas durou o suficiente para que a canção fosse ouvida de novo, uma derradeira vez. Juntos. Ao entardecer.


(Como de costume o tempo voltou a passar. Apenas o tempo.)


E mais outro tempo virá ainda onde não saberás sequer o meu nome. Um nome que se apagará pouco a pouco dos teus lábios, da tua memória. E seremos reduzidos a algumas canções. Ou só a uma.

(Post by Jota Marques)

terça-feira, 15 de novembro de 2022

BOB DYLAN ~ "MASTERS OF WAR"

MASTERS OF WAR
(recorded April 24, 1963)


Come you masters of war
You that build the big guns
You that build the death planes
You that build all the bombs
You that hide behind walls
You that hide behind desks
I just want you to know
I can see through your masks
 
You that never done nothin'
But build to destroy
You play with my world
Like it's your little toy
You put a gun in my hand
And you hide from my eyes
And you turn and run farther
When the fast bullets fly
 
Like Judas of old
You lie and deceive
A world war can be won
You want me to believe
But I see through your eyes
And I see through your brain
Like I see through the water
That runs down my drain
 
You fasten all the triggers
For the others to fire
Then you set back and watch
While the death count gets higher
You hide in your mansion
While the young people's blood
Flows out of their bodies
And is buried in the mud
 
You've thrown the worst fear
That can ever be hurled
Fear to bring children
Into the world
For threatening my baby
Unborn and unnamed
You ain't worth the blood
That runs in your veins
 
How much do I know
To talk out of turn?
You might say that I'm young
You might say I'm unlearned
But there's one thing I know
Though I'm younger than you
Even Jesus would never
Forgive what you do
 
Let me ask you one question
Is your money that good?
Will it buy you forgiveness?
Do you think that it could?
I think you will find
When your death takes its toll
All the money you made
Will never buy back your soul
 
And I hope that you die
And your death will come soon
I will follow your casket
By the pale afternoon
And I'll watch while you're lowered
Down to your deathbed
And I'll stand over your grave
'Til I'm sure that you're dead



SENHORES DA GUERRA

 

Vinde, senhores da guerra
Vós que construís todas as armas
Vós que construís os aviões da morte
Vós que construís as grandes bombas
Vós que vos escondeis atrás de muros
Vós que vos escondeis atrás de secretárias
Eu só quero que vocês saibam
Que consigo ver através das vossas máscaras
 
Vós que nunca fizestes nada
Senão construir para destruir
Vós brincais com o meu mundo
Como se fosse o vosso brinquedinho
Vós colocais-me uma arma na mão
E escondeis-vos dos meus olhos
E virais as costas e fugis para bem longe
Quando voam as balas velozes
 
Como o Judas de outrora
Vós mentis e enganais
Uma guerra mundial pode ser ganha
Vós quereis que acredite
Mas vejo através dos vossos olhos
E vejo através da vossa mente
Como vejo através da água
Que se escoa pelo cano abaixo
 
Vós firmais os gatilhos
Para os outros dispararem
Depois recuais e ficais a ver
Quando a contagem de mortes se eleva
Vós escondei-vos na vossa mansão
Enquanto o sangue dos jovens
Lhes escorre dos corpos
E se enterra na lama
 
Vós lançaste o pior dos medos
Que alguma vez se pode proferir
Medo de trazer filhos
Ao mundo
Por ameaçardes o meu filho
Por nascer e sem nome
Não valeis o sangue
Que vos corre nas veias
 
Quanto é que eu sei
Para falar o que não devo
Vós podeis dizer que sou novo
Vós podeis dizer que sou ignorante
Mas uma coisa há que eu sei
Ainda que seja mais novo que vós
Nem mesmo Jesus jamais
Perdoaria o que fazeis
 
Deixai-me fazer-vos uma pergunta
O vosso dinheiro é assim tão bom
CVomprar-vos-á o perdão
Achais que poderia
Penso que descobrireis
Quando a vossa morte vier cobrar o seu direito
Que todo o dinheiro que ganhastes
Jamais vos resgatará a alma
 
E espero que vocês morram
E a vossa morte chegue depressa
Seguirei o vosso caixão
Na pálida tarde
E ficarei a ver até vos baixarem
Ao vosso leito de morte
E vou vigiar a vossa campa
Até ter a certeza que estais mortos



Tradução de Angelina Barbosa e Pedro Serrano
in "Canções Volume 1 (1962-1973)"
Editora: Relógio D'Água, Setembro de 2006

(Post by Jota Marques)

ZORBÁS ~ NIKOS KAZANTZAKIS

«Ensina-me a dançar. Ensinas?» Anthony Quinn, na pele do inesquecível Zorba, responde a Alan Bates: «Dançar? Disseste dançar? Anda, rapaz.» Então entra a música de Mikis Theodorakis e o resto já se sabe. Dançam. Zorba ri, transborda vida. A última cena do filme "Zorba, o Grego (Alexis Zorbás)", de Michael Cacoyannis (1964), a partir da obra homónima do escritor grego Nikos Kazantzakis, é talvez uma boa porta para a sua extensa obra. Zorbás é uma das criações mais inesquecíveis da literatura - uma personagem da estatura de um Falstaff ou de um Sancho Pança. A sua idade avançada não diminuiu o entusiasmo e o deslumbramento com que acolhe tudo o que a vida lhe traz, esteja ele a trabalhar na mina, a confrontar os monges loucos de um mosteiro na montanha, a embelezar as histórias da sua vida ou a fazer amor para evitar o pecado. Zorbás conhece todas as alegrias e tristezas da vida, e através do seu exemplo, o narrador alcança uma compreensão genuína do que significa ser humano. Para seu deslumbramento e embaraço.

Mikis Theodorakis, autor da música de "Zorba, o Grego" (1964)

Publicado primeiramente em inglês em 1952, "Vida e Andanças de Alexis Zorbás" é uma obra popular e bastante conhecida de Kazantzakis. Como outros tantos romances do autor, este foi escrito numa fase tardia da sua vida, após vários anos a viajar, a escrever, e a estudar religião e filosofia. O narrador do livro é modelado conforme o rigor intelectual de Kazantzakis, ao passo que a personagem Zorba parece ser uma personificação do élan vital encontrado na filosofia de Henri Bergson, a cujas palestras Kazantzakis assistiu em Paris. O romance é narrado por um escritor e intelectual cuja vida se cingiu aos livros e às ideias, ao invés da vida concreta. Para mergulhar numa vida de acção, decide reabrir uma mina abandonada na ilha de Creta. Zorba, um homem grande cheio de paixão e entusiasmo pela vida, encontra o narrador à espera do barco para Creta, e impulsivamente pede-lhe para partir com ele. Pressentindo que Zorba personifica a vida que procura, o narrador aceita Zorba como companheiro e capataz da mina.

Irene Papas em "Zorba, o Grego" (1964)

São dadas as boas-vindas aos dois na ilha, sendo que Zorba prontamente desenvolve uma relação com a Madame Hortense, uma cortesã francesa envelhecida que recorda ter sido a amante de vários almirantes entre outros. Ao passo que o narrador permanece introspetivo e reservado, Zorba é tempestuoso e persegue cada tarefa e oportunidade como ocasiões para uma possível celebração. E assim, deseja possuir várias mulheres, canta, dança, luta, come e trabalha – e todas estas actividades são cometidas com o mesmo deleite e entusiasmo. Sem ilusões, acredita que tanto o homem como a mulher são animais, e que as igrejas e os governos são antros de corrupção. Recusa-se a aceitar o envelhecimento e a morte, mas continua a saborear o que de mau e bom a vida tem para oferecer. Zorba insiste que o narrador persiga a viúva da vila, que é odiada pelos habitantes pela sua beleza inacessível. Logo depois de o narrador passar uma noite com ela, o cadáver de um jovem que foi recusado pela viúva é encontrado. Apesar de Zorba lutar para a salvar, os habitantes acabam por matá-la num sacrífico ritual sexualizado. Após o narrador prometer a mão de Zorba em casamento a Madame Hortense, Zorba, com grande cortesia, aceita o enlace devido à felicidade manifestada por Hortense. Contudo, antes da cerimónia ser consumada, esta morre de pneumonia. O livro termina com a separação do narrador e de Zorba.

Anthony Quinn e Alan Bates em "Zorba, o Grego" (1964)

O encontro real com George Zorbás, um camponês mais velho, mineiro, de grande sabedoria e com quem Kazantzakis estabeleceria uma relação de forte amizade, foi determinante para o escritor. Kazantzakis, nas suas próprias palavras, diz que não é um intelectual. Antes, «uma alma selvagem». Quem foi então aquele homem que escreveu poesia, romances, ensaios filosóficos, guiões, livros de viagens, e traduziu clássicos como "A Divina Comédia" de Dante ou o "Fausto" de Goethe? O pintor Roussetos Panayotakis descreve-o como «uma corrente elétrica». «Andava sempre com um chapéu de chuva e um livro ou jornal debaixo do braço», diz ainda, trazendo à memória a sua imagem.


Nikos Kazantzakis (1883-1957) foi o maior escritor da Grécia da primeira metade do século XX. Nasceu em Creta durante o período de revolta contra o Império Otomano. Viveu uma vida repleta, com incontáveis viagens, que alimentaram a sua escrita, aguçando o seu olhar dirigido ao Homem como igual na essência em cada canto do mundo. Todavia, talvez nada como a Grécia natal tenha alimentado as suas histórias. «Ele abria as asas por todo o mundo e usando apenas lendas locais, que normalmente diriam algo apenas para ao nativos de Creta, como o capitão Michalis ou Zorba, o Grego, conseguia enfatizar os aspetos universais, e criar um universo acessível a toda a gente, em todo o lado», afirma o escritor Nikos Chrissos. Escreveu romances, poemas, ensaios, livros de viagens e peças de teatro. Mas mais do que erudito, foi um homem de acção. Alistou-se como voluntário no Exército Grego durante a guerra dos Balcãs, viajou pela Europa e pela Ásia, empenhando-se em causas e combatendo ao lado das facções que apoiava. No seu epitáfio lê-se: «Não tenho nenhuma esperança. Não tenho medo de nada. Sou livre.»

Alan Bates e Anthony Quinn em "Zorba, o Grego" (1964)

«No universo romancesco, nomeadamente no "Cristo Recrucificado", há um conjunto vasto de personagens-tipo que também são universais mas sem nunca deixarem de ter uma componente muito evidente de ligação à terra cretense. Aliás, Kazantzakis é primeiro que tudo cretense, e depois grego e universal», diz José António Costa Ideias: «As personagens são universais, sobretudo na tentativa de conquista da liberdade, que é tão importante para Kazantzakis, é por isso que é tão importante o aspeto colectivo. Ele dá grande relevo às massas, ao colectivo. mesmo no teatro há essa dimensão.» É autor de obras como "Cristo Recrucificado", "O Bom Demónio", "Liberdade ou Morte", "A Última Tentação de Cristo" ou "Carta a Greco", publicadas há muito em Portugal por editoras como a Portugália e a Ulisseia, sobretudo em traduções a partir do francês.

O EP português da banda-sonora do filme (edição de 1965)

Kazantzakis aproximou-se do socialismo, mas pedia tanto a bolcheviques como a fascistas que eliminassem o seu nome dos seus livros: «É absolutamente contra a minha natureza pertencer a um gangue ou a uma multidão.» «Há nele uma tentativa em parte conseguida de síntese. Kazantzakis percorre várias linhas, várias áreas, aproxima-se de várias correntes, como o Cristianismo, mas também o Budismo, o Marxismo... Essa ânsia de conhecimento e de liberdade leva-o a contactar e até abraçar pontualmente estes ideiais», afirma Costa Ideias. «Na dimensão espiritual do autor, está em causa não tanto a "religião no sentido convencional do termo", organizada, mas "uma procura incessante pelos limites do próprio homem". Rejeitado por alguns cristãos, a relação com a Igreja foi, aliás, problemática até ao final da sua vida. Depois de recusarem que o seu corpo estivesse na capela da Arquidiocese de Atenas, Kazantzakis foi levado para Creta, onde o arcebispo celebrou a missa fúnebre. Todavia, nenhum membro do clero queria estar no enterro, por medo das reações. Acabou por fazê-lo um padre militar num funeral onde estiveram milhares de pessoas e onde até à manhã do dia seguinte a sua vida foi celebrada. Hoje em dia na Grécia está a operar-se uma recuperação e reavaliação crítica da sua obra, sobretudo no meio académica, mas também na opinião pública.»

Willem Dafoe em "A Última Tentação de Cristo" (1988)

«Talvez pela antiguidade da sua vida e obra, pela hegemonia das literaturas inglesa, francesa, americana e latino-americana, ou mesmo pela natureza iconoclasta do seu pensamento, se possa explicar o motivo pelo qual tão pouco do trabalho de Nikos Kazantzakis tenha chegado a Portugal até agora: apenas uma edição de 1984 de "Cristo Recrucificado", o seu relato de uma encenação teatral da Paixão de Cristo numa aldeia grega da Anatólia», refere Pedro Miranda na revista "Sábado". E continua: «Não falamos afinal, apenas de um dos maiores e mais lidos autores do século XX no seu país, mas de um escritor com larga repercussão internacional, por nove vezes tido em conta pela Academia Sueca para vencer o Nobel da Literatura e perdendo o último, de 1957, ano da sua morte, para Albert Camus por apenas um voto. Camus diria, mais tarde, que Kazantzakis merecia a distinção "100 vezes mais" do que ele próprio. Depois da sua morte, contribuíram igualmente para a difusão do seu nome além-fronteiras duas grandes obras cinematográficas baseadas no seu trabalho: "A Última Tentação de Cristo", de Martin Scorsese (1988) com Willem Dafoe no papel de Jesus; e "Zorba, o Grego", uma produção grega de 1964, que arrecadou 3 Óscares - melhor actriz secundária para Lila Kedrova, Fotografia e Direcção Artística -, tendo obtido ainda mais 4 nomeações - Filme, Realizador, Actor (Anthony Quinn) e Argumento-adaptado.

É na obra que agora nos chega, pela primeira vez em português , que se baseia este último filme: "Vidas e Andanças de Alexis Zorbás", geralmente tido como um dos melhores livros de Kazantzakis. O que o filme capta na perfeição é a caracterização de uma personagem absolutamente sui generis, eternizada no écran por Anthony Quinn, num desempenho tido como o mais memorável da sua carreira: um velho carismático e hedonista que ama a vida e a liberdade, e que entra na vida do narrador simplesmente pedindo que o leve com ele na sua viagem, o que, contra a sua natureza recatada, acaba por fazer. O que escapa à adaptação, no entanto, é a dimensão espiritual do embate entre a personagem do narrador, qual D. Quixote irremediàvelmente idealista, romântico e perdido nos seus livros (uma versão ficcionada do próprio Kazantzakis) e Zorbás, um Sancho Pança pragmático, impermeável a filosofias, o que o exorta a experienciar o mundo com as mãos e os pés, em vez de com a cabeça, uma espécie de microcosmos do eterno confronto entre razão e emoção. De facto, ler o romance é depararmo-nos, ao virar de cada página, com uma nova inspecção da condição humana, seja pelo prisma do desapego de Buda, do inferno de Dante ou do rumo certo para uma Humanidade perdida entre Deus e o Diabo.»

Editora: Edições 70 (Novembro 2022)
ISBN: 978-972-442-649-5
Nº de páginas: 384

(Post by Jota Marques)