Maria
do Rosário Pedreira vence prémio literário Correntes d’Escritas 2023
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Maria do Rosário Pedreira (Lisboa, 21 de setembro de 1959) é uma editora, escritora, poetisa e letrista portuguesa. É a mais mediática editora portuguesa, responsável editorial no grupo LeYa.
Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Estudos Franceses e Ingleses, foi professora durante cinco anos, na década de 1980.
Em 1987 tornou-se editora graças ao esforço do Prof. António Manuel Baptista. Iniciou esta atividade na área dos livros de divulgação científica.
Como escritora, tem publicados vários trabalhos de ficção, poesia, crónicas e literatura juvenil, procurando neste último género a transmissão de valores humanos e culturais. Para a autora – já distinguida com alguns prémios literários –, a casa pode ser considerada como um mundo onde se encerra tudo aquilo que vai perdurando, mesmo que sob a forma da memória, nostalgicamente.
É autora de várias letras musicais, cantadas por Carlos do Carmo, António Zambujo, Aldina Duarte, Ana Moura e, mais recentemente, por Salvador Sobral.
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A escritora portuguesa Maria do Rosário Pedreira venceu o Prémio Literário Casino da Póvoa 2023, com o livro “O Meu Corpo Humano”, atribuído no âmbito do encontro literário Correntes d’Escritas, na Póvoa de Varzim, anunciou hoje a organização.
O júri do concurso decidiu distinguir a obra desta autora, de 63 anos, nascida em Lisboa, enaltecendo em “O Meu Corpo Humano” “a sua coerência temática e estilística, bem como a ousadia na forma como aborda a experiência do corpo humano nas suas múltiplas dimensões”.
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O Meu Corpo Humano
de Maria do Rosário Pedreira
Editor: Quetzal Editores
Edição: abril de 2022
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É o meu corpo
humano: vê, ouve,
toca, pensa e
dói-lhe
Volto porque
Preciso muito
Que me amem.
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peito
Todos querem saber se
os meus
lábios ainda estão
cheios dos teus
beijos, se as minhas
mãos se abrem
ainda para as tuas nos
passeios de
verão. Mil olhos me
perguntam se
este corpo que vêem
agora assim
amarrotado continua a
receber-te
na cama, antes do
sono, quando o
pano azul-escuro da
noite cai sobre
o mundo e o vento leva
as estrelas
para longe de casa.
Não lhes conto:
o que há no meu peito
é entre nós.
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Útero
Ando com o filho à
fome. Os dois
no mesmo corpo, a
beliscar a morte
todos os dias. Feito
de mim, o menino
já não reclama e
adormece por horas
sentado no ventre. No
hospital,
a doutora quer saber o
que comemos,
e eu digo que quase
sempre correntes
de ar – em dias de
sorte, um vento
salgado. Ela franze o
nariz ao que julga
piada; mas depois
estranha o meu filho
tão quieto e pergunta
se costumo falar
com ele. Digo que sim,
que me responde
o eco do estômago vazio.
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Há uma melancolia que atravessa o livro, uma “tristeza passada a ferro,/ sem um vinco”, consciência das sombras que pairam sobre o tempo presente, espectros de fomes e misérias e horrores da guerra, despertando-nos “de um escândalo para outro escândalo”, como se diz numa invocação dantesca, em diálogo com o Canto VI da “Divina Comédia”. Mas guardamos sobretudo os achados, as súbitas iluminações: a “saudade” como “um sulco na terra”; freixos a “estenderem os braços para o verão”; ameixas que são “lâmpadas acesas”. E essa capacidade de fixar imagens que se tornam mais espessas a cada nova leitura: “A camisa branca estendida na corda/ do quintal é uma nuvem. Há pouco, / quando a fui pendurar, ainda chovia. // Agora, que o vento sopra forte dentro/ dela, vejo de repente o teu tronco a/ vesti-la. Porém, se estendo os braços/ para ele, só encontro o vazio. / Triste, // tento dizer-me que é apenas uma/ camisa; mas, sem querer, volto// para casa com a nuvem na cabeça.” / JOSÉ MÁRIO SILVA (Expresso 50)
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