segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

FLORBELA ESPANCA ~ Poesia

Florbela Espanca 

Florbela Espanca 
(8.dezembro.1894 - 8.dezembro.1930)

Fanatismo

Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

"Tudo no mundo é frágil, tudo passa..."
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:
"Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!..." 

*

"Florbela d’Alma da Conceição Espanca (1894-1930), nome adotado por Flor Bela Lobo, foi a poetisa e um dos mais importantes nomes da Literatura Portuguesa. Florbela abordou temas como o amor, a erotização, a angústia e o sofrimento, trazendo, sempre, a figura feminina, para o primeiro plano da sua vida e nas suas obras."

"Teve duas antologias publicadas em vida: Livro de mágoas (1919) e Livro de Sóror Saudade (1923). Outras três foram lançadas postumamente: Charneca em flor (1931), Juvenília (1931) e Reliquiae (1934). Além da poesia, a autora portuguesa escreveu para jornais e traduziu obras literárias."

"Nascida em Vila Viçosa, na região centro-sul de Portugal, Florbela perdeu a mãe muito cedo. Filha ilegítima de João Maria Espanca, foi registrada como se tivesse pai desconhecido e com o nome de Flor Bela Lobo. No entanto, João foi responsável por sua criação junto com a esposa, Mariana Espanca.”

Eu

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida...
Sombra de névoa ténue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber por quê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou!

*

Entre os anos 1899 e 1908, Florbela frequentou a escola em Vila Viçosa e, nessa época, começou já a escrever os seus primeiros textos. Assinava os seus trabalhos como Flor d’Alma da Conceição.

Escreveu seu primeiro poema entre 1903 e 1904: “A vida e a morte”. Na mesma época, fez um soneto em homenagem ao seu irmão Apeles e um texto para o aniversário do pai. O primeiro conto escrito por ela foi em 1907, sobre sua mãe biológica, que morreria um ano depois.

Apesar de não levantar bandeiras sociais, como o feminismo, Florbela é considerada uma mulher à frente de seu tempo, vencendo barreiras da sociedade época.

Foi uma das primeiras a frequentar o curso secundário, no Liceu Masculino, em Évora, e a primeira mulher a entrar no curso de Direito da Universidade de Lisboa.

Formou-se em Letras e, num meio dominado por homens, foi colaboradora num jornal, em Vila Viçosa, em 1927.

O seu pioneirismo e independência feminina estiveram também presentes na sua vida pessoal. Foi casada três vezes, algo incomum para as mulheres da sua época.

Intensa, Florbela abordou o erotismo numa parte dos seus sonetos. Mostrou que o tema poderia ser tratado por mulheres, o que era um tabu no início do século XX.

Em 1927, Florbela Espanca perdeu o irmão que morreu num acidente de avião, o que a marcou profundamente, até o fim da sua vida. Em sua homenagem, escreveu um conjunto de contos, no livro "As máscaras do destino", publicado somente em 1931, após a sua morte .

Cada vez mais debilitada pelo falecimento do irmão, Florbela tentou o suicídio por três vezes, falhando nas duas primeiras e sendo a última fatal. Morreu no dia do seu aniversário, aos 36 anos, em 8 de dezembro de 1930, na cidade de Matosinhos, com uma superdose de barbitúricos.

*

*

Minha culpa

Sei lá! Sei lá! Eu sei lá bem
Quem sou?! Um fogo-fátuo, uma miragem...
Sou um reflexo... um canto de paisagem
Ou apenas cenário! Um vaivém...
Como a sorte: hoje aqui, depois além!
Sei lá quem Sou?! Sei lá! Sou a roupagem
Dum doido que partiu numa romagem
E nunca mais voltou! Eu sei lá quem!...
Sou um verme que um dia quis ser astro...
Uma estátua truncada de alabastro...
Uma chaga sangrenta do Senhor...
Sei lá quem sou?! Sei lá! Cumprindo os fados,
Num mundo de vaidades e pecados,
Sou mais um mau, sou mais um pecador...


*


*



...em construção 



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