segunda-feira, 24 de outubro de 2022

PABLO NERUDA: 20 POEMAS DE AMOR E UMA CANÇÃO DESESPERADA

É um livrinho pequeno, em contraste absoluto com a grandiosidade do seu autor. Foi escrito em 1924, mas a 1ª edição portuguesa ocorreu apenas em Dezembro de 1971, talvez de propósito, visto ter sido um ano mágico para mim, no que aos amores diz respeito: «De novo pensamos na injustiça do destino! Grandes injustos somos! Pois se nos amamos..! Mas... injustos? Pois se nos amamos..., porque teremos que viver sempre estes momentos tristes da distância?!!! Queria escrever coisas belas, reviver momentos belos, anteviver um futuro belo..! Mas não consigo pensar em beleza! A verdade suplanta-a e resta-me a solidão triste que terei de enfrentar. A música corre..., a NOSSA música, que ouvimos tantas vezes entregues à imagem um do outro! Estou desesperada, reconhecida, esperançada! Tudo é muito confuso, caótico! Surgem-me pensamentos sem ligação numa doação total ao que sinto por ti! Não digo adeus..! Não é palavra para dois seres que se amam! Um grande beijo, um beijo eterno, muito meigo... até... até... até quando quiseres, porque sou tua a todo o momento!» (Letícia Peres, Lisboa, 29 de Setembro de 1971)

"20 Poemas de Amor e uma Canção Desesperada", uma edição bilingue e ilustrada, com tradução de Fernando Assis Pacheco, é consequentemente um dos livros da minha vida, que tenho a necessidade de ter sempre à mão. Presentemente tenho comigo a sétima edição, publicada em Maio de 1977. Aquela primeira edição ofereci-a à mesma pessoa que escreveu as palavras acima referidas, 22 anos depois, e com a seguinte dedicatória: «Existem amores, vagos e fugidios, que duram apenas 3 dias. Mas há outros, raros e preciosos, que o tempo e a saudade alimentam e que duram toda a vida.»


TAMBÉM ESTE CREPÚSCULO...

 

        Também este crepúsculo nós perdemos.

        Ninguém nos viu hoje à tarde de mãos dadas

        enquanto a noite azul caía sobre o mundo.

 

        Olhei da minha janela

        a festa do poente nas encostas ao longe.

 

        Às vezes como uma moeda

        acendia-se um pedaço de sol nas minhas mãos.

 

        Eu recordava-te com a alma apertada

        por essa tristeza que tu me conheces.

 

        Onde estavas então?

        Entre que gente?

        Dizendo que palavras?

        Porque vem até mim todo o amor de repente

        quando me sinto triste, e te sinto tão longe?

 

        Caiu o livro em que sempre pegamos ao

                                                          [crepúsculo

        e como um cão ferido rodou a minha capa aos

                                                                   [pés.

 

        Sempre, sempre te afastas pela tarde

        para onde o crepúsculo corre apagando estátuas.


(Pablo Neruda, 1924)

(Post by Jota Marques)

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