Esta é a história comovente de Zezé, um menino de seis anos nascido no seio de uma família muito pobre. Zezé é inteligente, sensível e criativo, mas muito endiabrado. Carente do afecto que não encontra junto do pai e da mãe, mais preocupados em sobreviver a cada dia, o menino perde-se nas ruas, onde só lhe dá para inventar travessuras. Tendo aprendido demasiado cedo a dor e a tristeza, Zezé acaba por usar o mundo da sua imaginação para fugir da realidade da vida: toma por confidente um pé de laranja lima, a que chama Xururuca e ao qual revela os seus sonhos e desejos. Será nesta fantasia que Zezé vai encontrar a alegria de viver e a força para vencer as suas adversidades. "O Meu Pé de Laranja Lima" é a obra maior de José Mauro de Vasconcelos, editada pela primeira vez em Maio de 1968. Eu viria a comprá-la em Lourenço Marques, a 28 de Abril de 1973, dois dias antes de completar os meus 20 anos. Um livro que urge descobrir, ou reencontrar, e que é aclamado como um dos mais importantes livros juvenis em língua portuguesa.
José Mauro de Vasconcelos tinha ascendência indígena e portuguesa. Nasceu em Bangu, bairro do Rio de Janeiro e passou a infância no Natal, onde foi criado com muito sol e muita água. Aos nove anos de idade aprendeu a nadar, e com prazer relembrava os dias de contentamento, quando se atirava às águas do Potengi, quase na boca do mar, a fim de treinar para as provas de grande distância. Com frequência ia mar adentro, protegido por uma canoa, porque a barra de Natal estava sempre infestada de tubarões. Ganhou vários campeonatos de natação e, como todo o menino, gostava de futebol e de trepar às árvores. Além do interesse pelo desporto, já se interessava, com 15 anos, pelos romances de Graciliano Ramos, Paulo Setúbal e José Lins do Rego. Depois do liceu, os estudos de José Mauro como autodidacta foram sempre feitos à base de trabalho. O seu primeiro emprego, dos dezesseis aos dezessete anos, foi treinador de boxe (peso-pluma): recebia 100 cruzeiros (velhos) por cada combate no Rio de Janeiro. Trabalhou numa fazenda em Mazomba, perto de Itaguaí, a carregar bananas. Depois, foi viver como pescador no litoral fluminense, onde não ficou por muito tempo, partindo em seguida para o Recife. Ali exerceu o cargo de professor primário num núcleo de pescadores. Da capital pernambucana, José Mauro saiu para começar um incessante vai-vem, do Norte ao Sul, e vice-versa, permanecendo um pouco em cada lugar, para em seguida enveredar pelo sertão e viver entre os índios.
Dotado de uma prodigiosa capacidade para contar histórias, possuindo uma fabulosa memória, candente imaginação e com uma volumosa experiência humana, José Mauro não quis ser escritor, foi obrigado a sê-lo. Os seus romances, como lavas de um vulcão, foram lançados para fora, porque transbordavam de emoções. Ele tinha de escrever e de contar coisas. O autor de tantos e belos romances como "Banana Brava" (1942), "Arara Vermelha" (1953), "Rosinha, Minha Canoa" (1962), "Doidão" (1963), ou "Coração de Vidro" (1964), tinha um método originalíssimo de escrever. De início, escolhia os cenários onde se iriam movimentar os seus personagens. Transportava-se então para o local, onde realizava estudos minuciosos. Em seguida, José Mauro dava asas à fantasia e, na sua imaginação, construía todo o romance, compondo até mesmo as frases do diálogo. «Quando a história está inteiramente feita na imaginação», revelava o escritor, «é que começo a escrever. Só trabalho quando tenho a impressão de que o romance está saindo por todos os poros do corpo. Então vai tudo a jacto».
E continuava: «Escrevo os meus livros em poucos dias. Mas em compensação passo anos ruminando as ideias. Escrevo tudo à máquina. Faço um capítulo inteiro e depois é que releio o que escrevi. Escrevo a qualquer hora, do dia ou da noite. Quando estou a escrever entro em transe. Só paro de bater nas teclas da máquina quando os dedos doem. Só aí percebo quanto trabalhei. Sou um cara capaz de varar dias escrevendo até a exaustão. Tanto faz escrever os capítulos, um após outro, como dar saltos. Isso porque todos os capítulos estão já produzidos no meu cérebro. Pouco importa escrever a sequência, como alterar a ordem. No fim dá tudo certinho.» José Mauro morreu de broncopneumonia, a 24 de Julho de 1984, com 64 anos, em São Paulo. Está sepultado no Cemitério do Araçá.
(Post by Jota Marques)
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